segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Porque é que o Movimento "Mulheres de Prata" irrita alguma mulheres?[eu explico]



Os comentários mais desagradáveis que tenho tido por aqui aparecem sempre, curiosamente, quando falo da minha decisão de ter deixado de pintar o cabelo e de ter criado o grupo de facebook "Mulheres de Prata". O que parece irritar alguns leitores (leitoras, na maioria), é o facto de acharem:
1. que estou a querer catequizar alguém, 
2. que passei a diabolizar todas as mulheres que não decidiram o mesmo que eu, 
3. que acho que esta é uma decisão que pode mudar o mundo.

Comecemos pela primeira ordem de irritação:
Não quero convencer ninguém a fazer nada, porque não me julgo detentora de verdade nenhuma. Tenho o direito, sim, de partilhar uma decisão minha e se essa decisão for a de outras mulheres, porreiro encantado da vida. A criação do grupo Mulheres de Prata foi exactamente por isso: porque não quis fazer este caminho sozinha e porque percebi que muitas outras mulheres já haviam tomado a decisão, ou queriam tomá-la e precisavam de um "empurrão". A verdade é que este grupo já conta com 2494 mulheres a quem faz sentido participar num espaço onde possam colocar dúvidas e anseios, partilhar boas e menos boas experiências, ganhar coragem para parar de pintar o cabelo ou escolher que a decisão não é para elas (como já aconteceu com algumas e cujos testemunhos são igualmente emocionantes). Não quero catequizar ninguém a parar de pintar o cabelo. Na verdade, se esta minha escolha inspirar outras mulheres a pintar o cabelo às riscas porque toda a vida tiveram esse sonho, parte do meu objectivo está cumprido. O que eu quero é ainda mais ambicioso: contribuir para que as mulheres se sintam fortes o suficiente para tomar decisões em relação ao seu corpo e à sua imagem, sem que se sintam escravizadas pelos outros, pela sociedade, por quem quer que seja. Mas também quero inspirar outras mulheres a aceitar os traços do envelhecimento com generosidade e com orgulho, porque entendo que cada fio de cabelo branco, como cada ruga, contam uma história: a minha, a tua, a nossa. Quero que as mulheres parem de se criticar umas às outras, sempre com o medo implícito de perderem terreno, porque cada uma de nós é única, singular, especial, incomparável.
Que nada disto se confunda com descuido nem desmazelo. Aceitarmo-nos como vamos ficando não implica desleixarmo-nos e desistirmos de nós. Ao contrário, esta decisão corajosa requer muitos cuidados e é por isso que no grupo vamos falando sobre as cores que mais favorecem as mulheres grisalhas, a maquilhagem, os acessórios. Aceitarmos a nossa imagem não implica deixarmo-nos ir. Não. Implica a força anímica para construirmos a nossa melhor versão em cada momento, numa reinvenção constante que nos devolve identidade e que nos obriga a uma criatividade diária. Se isto tudo é possível continuando a pintar o cabelo? Óbvio que sim. Se perdemos a nossa identidade e a nossa história quando pintamos o cabelo? Claro que não. A questão é que ninguém questiona a mulher que decide pintá-lo mas, acreditem, muita gente o faz quando ela decide deixar de o fazer, principalmente quando ainda é relativamente jovem. E a minha questão reside nisto: nesta falta de liberdade encapotada.

Quanto à segunda ordem de irritação, dizer que quem lê os posts que escrevo sobre este tema terá reparado que faço essa ressalva muitas vezes. Quem sou eu para diabolizar quem quer se que seja? Logo eu, que pintei o cabelo durante mais de vinte anos! Esta foi a minha escolha, mas a ideia é que consigamos todas fazer as nossas, sem pressão de nenhuma espécie. Esta não é uma escolha para todas as mulheres, mas que seja para todas aquelas que querem fazê-lo. E que seja uma escolha sem medo do que os clientes,  colegas de trabalho, patrões, maridos e amigas vão pensar.

No que se refere à terceira ordem de irritação, perdoem-me a falta de humildade, mas quero mudar o mundo, sim. Quero mudar o mundo da minha filha, para que ela possa sempre ser aceite e acolhida com as suas características únicas e intransmissíveis. Quero contribuir, um bocadinho que seja, para quebrar alguns mitos em relação à beleza no feminino, em relação ao envelhecimento no feminino (tão diferente do envelhecimento no masculino!), e ajudar a construir um mundo onde a minha filha de cabelo branco, às cores, às riscas, às bolas, tanto faz, possa sempre ser ela própria.

Terminar este post dizendo que não é por acaso que este é o tema, de todos os que tenho abordado por aqui, que levanta mais polémica. É sinal de que a liberdade de expressão (neste caso, através do direito que temos de deixar o cabelo ao natural, sem estigma, sem culpa, sem pressão, sem opiniões que ninguém pediu), é um valor ainda em construção.

13 comentários:

Anita disse...

Admiro a força, a coragem, para se tomar a decisão de se deixar de pintar o cabelo. Eu optei por não o pintar. Mas clarto, que cada um deve decidir o que é melhor para si.
Força

Escrever Fotografar Sonhar disse...

A verdade é que há pessoas que criticam só porque sim...
A critica mais espantosa que me fizeram por deixar de pintar o cabelo, veio de uma pessoa, que anos antes me criticou por começar a pintar... Vá-se lá compreender a mente humana...
bjs

Fátima Bento disse...

Olá Marta!

O teu cabelo está lindo!

Eu, não me vejo a fazer o mesmo porque, como dizes, casa caso é um caso, e se abraço o meu recente quinquagenário (foi há pouco mais de um mês), e cada marca de idade é aceite com naturalidade, existem traços físicos em mim que seriam esticados ao limite se o fizesse. E eu não me sinto preparada para isso. Luto com a minha imagem no espelho, luto por conseguir pôr a ideia do self-love (nos cuidados diários com o meu corpo) em prática não posso abrir mão de ter quem trate de uma parte minha - o cabelo.

A sério, sou um nadinha mal resolvida, mau grado a psicoterapia analítica me ter ajudado imenso durante estes anos, no que ao meu corpo diz respeito...

Talvez um dia mude.

Mas dou-te os parabéns pela iniciativa, e tenho amigas que já aderiram ao movimento. Eu não consigo.

Paula Ferrinho disse...


Penso que a determinação, segurança, descontração e envolvimento com que falas e sobre o que falas, aliado ao facto de seres muito bonita, amada e feliz, fará sempre "mossa" a quem tem vidas mais "vazias", será?
Cá por mim, adoro ler-te!

Um beijinho

S* disse...

Eu não o quero para mim, porque acho que não me favoreceria nada... mas tenho 29 anos e dezenas de brancas bem visíveis e não me importo nada com elas. Um dia que me importe, vou pintar, certamente... mas é por mim!

KANOKA disse...

Já há muito tempo que me passava pela cabeça deixar de pintar. Assim que a Marta lançou o grupo, fui das primeiras a aderir. Ganhei força, coragem e deixei de me importar com os comentários. O meu maior triunfo é haver quem ache até que estou melhor assim. Principalmente e com muito orgulho meu, o meu marido....
Não quero saber de conversas dessas e acho que estamos sempre a tempo de mudar o mundo.
Ana Crujo

Resgate Salta disse...

Não diria melhor! Adoro o meu cabelo de prata e adoro a minha liberdade de decisão sem ter que agradar à sociedade!

Beijinho

Maria do Resgate

Bi Rodrigues disse...

Boa noite a todo@s,
Não pinto o cabelo desde janeiro de 2017. Vários cortes depois, ainda estou em transição... e há dias em que a intolerância/perseguiçãpo aos cabelos brancos parece estar no auge... O grupo tem sido o meu esteio. Obrigada.

Xi disse...

Marta, não tenho nada a acrescentar. E percebo perfeitamente o que sentes quando alguém quase ti insulta e te "diminui" (tenta) ao dizer que não faz sentido deixar de pintar o cabelo com esta idade. Sinto o mesmo e ignoro... Aliás, digo sempre o que interessa para mim é estar bem e feliz. E isso é como me sinto neste momento. Feliz comigo, com a minha decisão e com a liberdade que tenho! Enfim... Ainda existe muita gente oca, sem mais nada com que se preocupar a não ser o a vida dos outros e acharem que sabem o que o outro sente... E que se acham no direito de julgar de forma gratuita. Vamos conseguir ir mudando o mundo aos poucos... Acredita! Bjs

Anónimo disse...

Falta de liberdade encapotada? Questionar o que quer que seja nao tira liberdade a ninguem, tao facil por a culpa na sociedade, nos homens, nos amigos, no ar que respiramos por nossas decisoes (ou falta delas). Quando parei de pintar me questionaram, mas entendo perfeitamente que era a titulo de curiosidade, por ser algo novo, uma mudanca, e sempre tem quem questione porque sim, geralmente ficamos melhor de cabelo pintado do que de cabelo grisalho. Ha mulheres que ficam lindissimas grisalhas (como uma que vi ao assistir um video da maquiadora Charlotte Tilbure no youtube), era uma senhora na casa dos 50 anos, grisalha e lindissima, nao consigo imaginar outra cor melhor nela, mas verdade seja dita, nem todas sao afortunadas assim, nem todas rejuvenescem com cabelo grisalho e sim o contrario. Com tudo isso, continuarei sem pintar. Facamos o que nos der na cabeca (caso nao prejudique ninguem), e caso nao facamos, a culpa e unicamente nossa.

Anónimo disse...

Cada um acredita no que quer. Só não queira que lhe digam que está líndissima e muito melhor assim, porque não está.

Anónimo disse...

Olá Marta. Sou uma das pessoas que não se revê na questão dos cabelos de prata.Continuo a pintar o meu. Mas a questão do envelhecimento não se resume a isto, como sabes. Há pior e temos que admitir que não é fácil envelhecer, sobretudo quando nos passaram a vida a dizer que éramos bonitas, como é o meu caso. Agora sou eu que tenho de dizer a mim própria que ainda o sou, mesmo mais flácida, com raízes, varizes, celulite... de tudo isto o mais fácil de controlar ainda são os brancos. Talvez daí a insistência em pinta-los todos os meses. Ganho uma breve ilusão de aparente juventude... beijinhos.Lua Azul 😊

Ana disse...

Ahahahahahah! Muito bom este comentário.