sábado, 2 de fevereiro de 2019

A minha "caixa negra"


A minha "caixa negra" é o meu telefone. É lá que tenho registados todos os números de telefone, que tenho guardadas todas as notas importantes, desde pensamentos soltos, até frases que me inspiram, senhas de acesso à minha vida inteira e receitas de cozinha. É no meu telefone que faço o calendário de todos os eventos que considero importantes, e é onde tenho gravados, para mais tarde recordar, todas as fotos e todos os vídeos dos meus filhos, e meus e do meu marido.
Tudo o que importa está guardado na minha "caixa negra", que faleceu há uma semana, depois de uma queda e de problemas técnicos relacionados com backups, clouds, recuperação de passwords, restauro de conta e cenas desta natureza que não vos sei explicar, mas que garanto, estão a ser tratadas, ainda que não no tempo útil que gostaria.
Isto quer dizer que o meu telefone só me permite fazer aquilo para que os telefones foram inicialmente criados e que já nos esquecemos: fazer e receber chamadas. De resto, está vazio como um balão sem ar: sem números de telefone, sem acesso a nenhuma rede social, zero, nada.
Poderia dizer-vos que estou a lidar bem com a situação, porque o que importa na vida são as pessoas e a relação que estabelecemos com elas. Afinal, um telefone é só um telefone e a vida continua. Acontece que não vos quero mentir só para ficar bem na fotografia. Já chorei muitas lágrimas com esta sensação de perda e de vazio, porque embora tenha acesso às pessoas que amo (o mais importante, de facto!), perdi o acesso às coisas que gosto e isso frustra-me e traz-me uma sensação de profundo vazio. Não consigo fazer chamadas por what´s app para o meu filho que está longe, não posso publicar nada no instagram, não acedo aos eventos que inseri no calendário, não sei o número de telefone de ninguém (e não identifico nunca quem me liga), não sei a senha das Finanças, não tenho a receita do bolo de alfarroba que alguém me deu, nem a frase da Agustina a que recorro nas Notas, quando preciso de inspiração. Bem vistas as coisas, falta-me uma parte da vida e isso é frustrante e entristece-me.
Mas como tenho esta mania obsessiva de tentar sempre ver o "copo meio cheio" e o sentido de tudo o que de menos bom me acontece na vida, dou por mim a procurar um propósito nisto. E descobri os seguintes:
Leio mais.
Consigo ficar mais focada numa única tarefa.
Sinto-me menos dispersa.
Olho mais para os meus filhos e menos para os écrans.
Vejo mais séries com o meu homem ao serão.
Revitalizei o blogue.
Deito-me mais cedo.
(...)

Quero que tudo isto se resolva o mais depressa possível, porque o meu telefone é um instrumento de trabalho e um elemento afectivo, a verdade é essa. Mas que o propósito desta fase não se perca depois, ou nada disto terá valido a pena.