sábado, 19 de abril de 2014

Da Páscoa [da minha infância]

Lembro os mimos da minha avó Auzenda e os folares com sabor a erva doce.
Lembro Portimão ao frio, mas cheia de gente, e os meus pais juntos, embora nem por isso felizes.
Da Páscoa da minha infância acho que não me lembro de mais nada, como aliás, há tantas coisas daquele tempo de que perdi a memória. 
Dou voltas à cabeça e tento imaginar-me criança. Esforço-me por resgatar imagens, cheiros e sons daquela época e descubro-me num hiato de tempo vazio. Como se tivesse dado um salto tão grande, que acabei por perder-me de onde pulei.
Às vezes acordo com recordações fugidias. Imagens em forma de flash ou sonhos desarrumados. E de tão longe que estou daquela criança que fui, baralho a realidade daquele tempo com fotos que  tenho visto: eu em Belém com a minha mãe; eu na Fortaleza de Portimão com os meus avós; eu nos meus aniversários na casa de Algés; eu sorridente sempre, mas acho que nem sempre com vontade de rir {há traços que se mantêm, por mais que os anos passem}.

A minha infância aparece-me sempre desfocada ou por detrás de uma lente com poeira.
A nitidez dos meus dias surge mais tarde {na adolescência} e ao contrário do que se vai lendo por aí, é desse período que guardo as melhores recordações. As que construíram grande parte da mulher que sou hoje.
Da Páscoa da minha infância lembro-me pouco, mas não acho que a infância seja a guardiã de todos os segredos e a origem de tudo o que somos. Chega-me o folar com sabor a erva doce e certeza de ter sido amada, mesmo que debaixo de algumas tempestades. O bastante para saber que podemos sair vivos de naufrágios valentes. A minha lição de vida.

1 comentário:

Papoila disse...

Muito bonito este texto.