sexta-feira, 13 de maio de 2016

"Divórcios Felizes?" [a opinião dos especialistas]


“Divórcios Felizes”?

por Ana Varão, Psicóloga e Mediadora Familiar*

A separação e/ou divórcio poderá assumir diversas formas. Porém, de um modo geral poderá afirmar-se que, enquanto momento de crise e ruptura na vida do casal, apresenta-se como um período susceptível de gerar desajustamento emocional, acarretando sofrimento para todos os membros da família.
Na verdade, não existem divórcios ou separações fáceis, particularmente nos casos em que o casal tem filhos pequenos. Enquanto período conturbado, colocam-se a todos os elementos familiares desafios e exigências.
Ainda que o processo de separação e/ou divórcio se revele um acontecimento difícil e um abalo intenso na vida familiar, podemos falar em divórcios bem ou mal sucedidos. Em primeiro lugar, devemos manter as crianças longe do conflito. A par disso, torna-se essencial garantir aos filhos que o contacto com ambos os progenitores será mantido, assim como o amor destes. A questão coloca-se não no divórcio em si, mas antes no modo como os progenitores o conduzem. O que está em causa num “divórcio bem sucedido” é a qualidade da relação familiar, antes, durante e após a separação conjugal. É a garantia de que a família sobrevive à ruptura do casal, e que a parentalidade persiste para além da conjugalidade.
Na minha prática clínica como Psicóloga, é com satisfação que recebo pais que me pedem ajuda no sentido de evitar, de algum modo, causar “danos” emocionais nos seus filhos como resultado da decisão de separação. Estes casos têm normalmente muito bom prognóstico uma vez que estamos perante pais que, apesar das suas divergências, têm em comum uma genuína preocupação com o bem-estar dos seus filhos e que conseguem por à frente dos seus sentimentos de zanga e mágoa, os interesses das crianças. A minha intervenção assume aqui um papel bastante preventivo e informativo, conduzindo todos os elementos da família a atravessar de forma positiva e adaptativa cada etapa do processo de divórcio: desde o momento de dar a notícia aos filhos, passando pela saída de um dos progenitores de casa, até ao período pós-divórcio onde todas as relações e interacções familiares terão de ser reajustadas. A intervenção é focada sobretudo nos progenitores que precisam aprender a deixar de se relacionar enquanto casal e funcionar enquanto pais separados, mas unidos no projecto de educar a criança. O desafio é que dois sistemas parentais funcionem conjuntamente - coparentalidade positiva - sendo promovidos padrões saudáveis de comunicação, cooperação, respeito e apoio mútuo.
O aparecimento de alterações comportamentais nas crianças com a separação tem sido fortemente relacionado com a existência de desentendimento parental. Pais altamente conflituosos recorrem com frequência aos Tribunais e envolvem-se diversas vezes em situações de incumprimento das suas responsabilidades parentais. O recurso desproporcionado às instâncias judiciais para resolução de conflitos e disputas familiares acarreta custos e tem consequências a vários níveis nos intervenientes. As crianças são envolvidas nesta batalha entre oponentes e conquista de lealdades, chegando mesmo a participar de falsas alegações contra um dos progenitores. Infelizmente o litígio promove ainda mais conflito, hostilidade e ressentimento, criando-se formas cada vez mais distorcidas de comunicação. Por conseguinte, estes padrões alterados de comunicação constituem um obstáculo ao desempenho eficiente das tarefas de coparentalidade.
Enfim, a investigação sugere que as alterações na comunicação interparental e nas relações pais-filhos, e a falta de contacto entre progenitores inibem o funcionamento eficiente da família, tornando mais difícil a coparentalidade. Ao invés, as crianças serão melhor ajustadas quando os seus pais trabalham em conjunto após o divórcio por forma a promover as suas necessidades, como é o caso das famílias que recorrem aos serviços de Mediação Familiar e que procuram formas conciliadoras de resolução de conflitos. Assim sendo, a melhor ajuda que os pais divorciados podem dar aos seus filhos, será sem dúvida, a garantia da cooperação e comunicação efectiva no que concerne às decisões relevantes da vida da criança.
Podemos falar em “divórcios felizes” se os pais:
    Mantiverem as crianças longe do conflito interparental ou de questões de lealdade
    Minimizarem as mudanças nas rotinas da criança
    Mantiverem uma relação afectiva positiva e emocionalmente significativa com os filhos
    Mantiverem entre si um relacionamento cordial marcado pelo respeito mútuo, comunicação positiva e cooperação, distinguindo papéis parentais de papéis conjugais
    Facilitarem e promoverem o saudável contacto e convívio da criança com ambos os progenitores e família alargada

*[Psicóloga, Mestre em Sexologia e Mediadora Familiar, Ana Varão é fundadora da Red Apple onde, para além das funções de gestão, assume o recrutamento de formadore e de colaboradores únicos e dinâmicos para a sua equipa, e pesquisa temas criativos e inovadores para as fomações. É, também, a mãe babada de duas crianças]