sábado, 19 de julho de 2014

Vazio [o ninho vazio ou a crise dos 40]

Os meus filhos acabaram de sair.
O silêncio que se instala é ensurdecedor, como um fantasma que assusta de morte e não se vê.
Pairo entre a sensação de liberdade e a angústia de não os ter. E penso na filha que sou, nos pais que tenho a sorte de ter, e nas vezes em que não lhes estou. Porque faz parte. Porque é o curso normal da vida.
Penso neles {nos meus pais} e vejo como têm seguido o seu rumo para além de mim. Imagino que nuns dias aos tropeções, noutros com passos firmes. 
Percebo na pele o que já li tantas vezes nos livros: se nós - os pais - não tivermos caminho próprio, corremos o risco de nos esfumarmos numa existência sem sentido, que os filhos começaram por ser nossos, mas afinal, são do mundo. São da vida deles. Das escolhas deles. Das vitórias e dos fracassos deles. 
Demos-lhe vida e {imagine-se!}, ganharam vida própria e existem para além do criador. Respiram e andam sozinhos, sonham sonhos que desconheceremos sempre, cheiram cheiros que nos passam ao lado, vêem coisas que não vemos. Voam alto e temos medo de os perder para sempre, ao mesmo tempo que se fazem voos rasantes, achamos que não lhes demos o impulso suficiente.
Olho para mim, aos 40 e num casamento novo a estrear, e mesmo assim, sinto medo de os ver partir. Eu, que tenho ainda tanta coisa para viver. 
E ao mesmo tempo que penso nisto, penso nas mulheres que se sentem engaioladas nas suas vidas há muitos anos e que ainda não descobriram que a vida é mesmo para ser vivida, e adivinho-lhes uma angústia ainda maior que a minha. As mesmas mulheres para quem a maternidade encerra tudo o que são, como se não tivessem uma identidade para além de serem mães. Uma visão aterradora, quando se percebe o inevitável: que os filhos dependentes de nós, partem.
Forço-me a imaginar os meus filhos do regresso. Maduros, decididos, de bem com a vida. Acharei que fiz um bom trabalho {mais uma vez, a merda do ego}. E obrigo-me a imaginar a mãe que nesse dia serei: tolerante com as escolhas deles, madura, de bem com a minha vida.
E no momento em que projecto isto, dou-me conta daquilo que já sei de cor, mas que nestes momentos de angústia, teimo em esquecer: que é tempo de existir para além da mãe que sou. E que só assim, resistirei ao voo alto que cada um dos meus filhos fará.


1 comentário:

Bibicunha disse...

Fantastico texto..consegue escrever o que me vai no coração tantas vezes...Bem Haja!!! Partilho da opinião e forma de estar na vida.