quinta-feira, 2 de julho de 2015

Paixão e outros mitos urbanos



Ontem, num programa da Antena 1, ouvi a escritora Inês Pedrosa dizer que a paixão com prazo de validade inevitável é um mito urbano.
Fiquei a pensar no assunto, porque me revi naquilo. Primeiro, no facto de ter alinhado com a "carneirada" e no ter acreditado, sem duvidar, que não há paixão que resista ao tempo, às idas ao supermercado e à farmácia, à falta de dinheiro no final do mês, às discussões por causa dos filhos, ao cheiro a refogado no cabelo. Segundo, por ter sido preciso chegar perto dos quarenta para começar a questionar esta "verdade absoluta", como a Inês questiona.
Podem dizer-me que não tenho tempo suficiente de relação com o meu marido para opinar com propriedade. Não tenho, de facto. Meia dúzia de anos não é muito tempo, mas conheço paixões avassaladoras que acabaram um mês depois de terem começado, e conheço outras que terminaram na lua-de-mel. Bem vistas as coisas, ter meia dúzia de anos com o meu marido e manter a tesão dos primeiros tempos já configura uma boa amostra, ou será que não?
Por esta razão e por outras que não vêm ao caso, começo a desconfiar destas certezas que nos "vendem" desde o berço e que aceitamos sem pestanejar, simplesmente porque sim. Que as paixões azedam como a sopa ao calor e que, inevitavelmente acabam. Mas se por um acaso da vida não terminam em tempo útil {as malvadas!}, desembocam naquilo a que a malta chama "amor" (que parece um conceito inimigo da paixão), e mais grave que isso, uma versão murcha e aborrecida daquilo que antes mexia com as entranhas no bom sentido.
Cada vez mais acho que o estado de paixão não tem que adormecer, para depois morrer com o tempo. Assim como não acho que todos os gatos são pardos, nem que todos os pecados são mortais. Gosto pouco de generalizações, porque somos muitos e muito diferentes, graças a Deus.
Quero acreditar que há paixões que duram, e que estar apaixonado não diminui o sentimento de profundo amor que nutrimos pelo outro. Não têm que ser sentimentos incompatíveis, nem excludentes. 
Não quero com isto dizer que estar apaixonado implicar viver a paixão 24 horas por dia, 365 dias por ano. Há noites em que adormeço num estado de amor e de paixão profundos pelo meu marido, e manhãs em que acordo capaz de lhe partir os dentes, se é que me entendem. Não vivo numa bolha e não tenho 10 anos.
Ainda assim, e com as flutuações típicas das relações humanas, continuo a viver momentos de grande paixão e continuo a sentir o mesmo desejo das primeiras vezes. E sim, também me irrito, também me zango muito, grito e praguejo, e então?
Não sei o que o futuro me reserva nesta matéria, como, aliás, em nenhuma. Sou uma mulher romântica e quero acreditar que viverei este amor {e esta paixão} para sempre, mas ninguém garante.
Sei apenas {e acho que por agora isso me basta}, que continuo perdidamente apaixonada e objecto de uma grande paixão, também. E sei que a ter prazo de validade, a maldita, já teria tido tempo e motivos de sobra para ficar moribunda.
Espero que isto seja um bom augúrio.

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