terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Das tragédias de todos nós

O País não pára de falar da mãe que envenenou os dois filhos e que se suicidou depois.
E na rua ouve-se revolta e consternação, porque acabar com a vida dos próprios filhos só pode ser um acto digno de um monstro.
Pois correndo o risco que me atirem tomates ou coisa pior, gosto pouco de lugares comuns e menos ainda de generalizações.
Porque por mais trágico e incompreensível que um acontecimento possa ser, há sempre uma história por trás {às vezes igualmente trágica e incompreensível}, que embora não justifique o injustificável e não devolva a vida de quem se foi inocentemente, pode explicar muita coisa.
Acredito que nenhuma sociedade pode passar por uma situação trágica destas sem tirar as suas lições. E fazê-lo não passa apenas por apontar o dedo, como se os actos monstruosos fizessem somente parte de um grupo de loucos e de proscritos. 
Como mãe e como Assistente Social que sou, estou convicta de que todos falhamos quando acontece uma tragédia destas. Porque se reflectirmos maduramente sobre tudo isto, da-mo-nos conta de que na nossa vida pessoal e profissional, nem sempre acolhemos o suficiente, não escutamos activamente, não paramos para perceber o outro e os sofrimentos do outro com tempo e espaço mental suficientes, simplesmente porque há sinais que nos são revelados e para os quais não estamos suficientemente atentos. E isto acontece com os nossos filhos, com os nossos pais, irmãos, amigos, utentes. Enfim, acontece com quem nos rodeia, porque andamos tantas vezes assoberbados connosco próprios e com o nosso mundo, que nem sempre conseguimos atender ao outro.
Nenhuma, absolutamente nenhuma tragédia deveria poder acontecer, mas se acontece, temos todos que saber o que retirar dela, porque a morte e o sofrimento gratuitos são demasiadamente insuportáveis.
E se há lição que retiro desta, é que todos nós { e todas nós, mães}, temos que conseguir identificar os nossos próprios sinais de alarme. O anúncio do fim da linha, um despertador latente que nos avisa que é preciso pedir ajuda. E que não faz mal.
Reflicto também sobre a filha e a amiga que sou, e as vezes em que, atolada com as minhas próprias"esquizofrenias", não escuto, nem acolho o suficiente. 
E penso na profissional que sou, e no risco de deformação profissional que todos temos, de automatizar e generalizar o que não é automatizável, nem generalizável - as pessoas.

Nada disto justifica o que aconteceu. Nada disto explica, nem alivia , nem devolve vida, nem atenua as dores, nem atribui sentido. Nada disto, infelizmente.
Mas pode ajudar a tomar decisões cruciais no futuro. E podem ser vidas ganhas.

MM

8 comentários:

Sexinho disse...

E se toda a gente fizesse este exercicio de introspecção
e pusesse em prática a conclusão a que aqui se chega, quase, mas só quase poderíamos pensar que não terião morrido em vão...
ue tristeza tão grande...

Sorriso disse...

Tens razão no que dizes quanto a mim. É fácil falar caindo em lugares comuns.Quando estes casos acontecem há que fazer uma introspecção muito profunda e ajuizar nestes casos tem tanto de complicado como de triste.

Frida Kahlo disse...

beijinhos

CM disse...

Escrevi um post no mesmo sentido sobre esta situação. E não tanto sobre a situação em concreto, que desconheço na sua plenitude, mas sobre a quantidade de pessoas que nos rodeam e que podem estar doentes. E as doenças mentais são das mais perigosas que existem.

Mafaldix disse...

É mesmo verdade. O desespero daquela mãe... Deu-lhes bolos, provavelmente dos que eles gostavam... Esta história arrepia-me muito. E por estar grávida ainda me emociono mais, se isso é possível.

Anónimo disse...

Olha, é MESMO assim.
Deixo-te um pequeno testemunho: o meu primeiro episódio de depressão major foi registado tinha eu 12 anos. Agora tenho 45, e desde que comecei a ser medicada, só interrompi durante as gravidezes e amamentações, ou quando, estava assintomática. Mas quando sentia a aproximação da 'espiral', ia ao médico, e voltava à medicação. Não o fazer influenciaria negativamente a vida da família, e isso era algo fora de questão. E os meus filhos e o seu bem estar estiveram sempre na linha da frente.
Depois, aos 18 anos, a minha filha caiu em depressão profunda (e foi mal diagnosticada como bipolar). Lá tive de reviver a minha experiência, passar por cima dela (sim, que agora, já há uns anos que não posso estar sem medicação)para ajudar a minha filha a superar a dela. Entretanto esta foi viver para Londres e agora está lá, já há 2 anos, feliz e... medicada com um antidepressivo.
Relaxemos? Não!...
O meu pequeno aos 14 anos começou a dar sinais de depressão e chumbou por faltas por ficar em casa. Levei-o ao médico que não deu grande importância. Segundo médico idem. Na repetição do 9º ano, só não voltou a reprovar por faltas porque os professores reconheceram-lhe a inteligência, e conseguiram 'apagar' as faltas e aceitar as minhas justificações - nesta altura já estava a ser acompanhado por uma psicóloga que seria fantástica para estar a assentar tijolos.
Este ano, 10º, e repete-se a situação. Neste momento está acompanhado por uma excelente psicóloga e por um psiquiatra já que necessita mesmo de medicação.
Eu? Eu ando por aqui a viver o mesmo pesadelo pela terceira vez, a subir paredes, apardalada, mas a fazer das tripas coração para levar o barco a bom porto.
E, obviamente, medicada...

Marisa Luna disse...

Olá!!!
Não posso deixar de comentar este post... nem sempre o faço, pois me sinto pequena perante a tuas palavras. Mas acho que tens absoluta razão e tenho de o dizer neste caso.
Tb sofro de depressão crónica e sei o que é estar mesmo descontrolada e fora de mim. Infelizmente. Estou medicada, acompanhada por uma psiquiatra. Tentei psicoterapia e constuma resultar em algumas fases. Mas a medicação tem de estar sempre presente. Não a consigo largar de forma alguma, apesar de andar a tentar há quase 1 ano. Não consigo? Paciência! Não quero é descontrolar-me ao ponto de perder a noção da realidade, que provavelmente foi o que aconteceu neste caso de que falas. Neste e noutros... não acredito que uma mãe possa estar bem quando faz tamanho horror e sei como podemos sair de nós se não formos acompanhadas. Acho que estes últimos casos que a comunicação social tem trazido até nós me têm reforçado a ideia de que todos nós temos uma responsabilidade social para com quem está ao nosso lado...
Obrigada!
Beijocas

Dolce Far Niente disse...

Um enorme beijinho a todos pelos comentários e pelas partilhas, algumas difíceis...
Um especial beijinho à Fátima e à Marisa. E força.